domingo, 5 de outubro de 2008

Palavras Para Quê


Sei agora o que sinto, entendo este resplandecente desejo que habita em mim...
Faz-me suar, palpitar, estremecer quando olho para ti...
É um turbilhão dominado, um sentimento valioso glorificado pela sua raridade em toda a minha história...
Subitamente ascende em mim, renasce nos meus lábios, torna os meus olhos em pedras rejubilantes, não sei se pedras preciosas ou banais, mas sei que têm um brilho verdadeiro...
São pequenos fragmentos da lua, não têm luz própria, apenas a reflectem, imitam-na de quem despende tanto sentimento em mim.
Tocas-me e eu vacilo numa penúria de emoções, sussurras-me e eu deliro carnalmente...
Sigo os teus contornos, as tuas feições pré-definidas, o tacto deixa de ser um sentido para se reverter numa necessidade, deixo de respirar oxigénio para respirar a tua presença...
Não me quero distanciar da tua rota, pois é ela que órbita no meu cosmos interior.
Não quero desperdiçar palavras, enquanto tenho beijos a transbordar dos meus lábios...
*a.d*

Juntos


Gosto de ti
Como se não houvesse amanhã,
Como se nada mais fosse importante...
Gosto de ti
E quero-te sempre,
Corpo a corpo,
Num suspiro profundo,
Nas palavras em mim,
No sorriso constante,
No beijo de saudade…
Quero o teu toque,
Céus como o anseio de novo...
Tuas mãos em meus cabelos,
Teus lábios no meu pescoço,
As tuas pernas enroladas nas minhas,
Os suspiros desenfreados
Entre gargalhadas inocentes…
E este desejo há-de continuar amanhã,
Sei que vou continuar a senti-lo…
Eu e tu...
Os dois juntos…

a.d

Quero-te


Quero olhar-te,
Quero abraçar-te,
Quero sentir-te,
Quero ver o teu sorriso envergonhar o sol,
Quero ver o teu olhar a empalidecer as estrelas,
Quero que povoes os meus sonhos,
Quero que me reconfortes quando tenho pesadelos,
Quero sentir o calor dos teus beijos,
Quero aquecer as tuas mãos frias,
Quero chorar de saudades,
Quero chorar de alegria,
Quero gritar a todos que te quero,
Quero guardar-te numa redoma só para mim,
Quero que gozem comigo e me chamem lamechas,
Quero fazê-los compreender o incompreensível,
Quero cantarolar ingenuamente como um menino,
Quero sentir-me desejado,
Quero esquecer a minha identidade e fundir-me na tua,
Quero sentir-me num sonho demasiado bom para ser verdade e ficar assim adormecido para sempre...
Quero...
Quero-te...
Quero-te a ti e apenas a ti...

*a.d*

Bola de Sabão


Bola de sabão de um coração profanado
Veio devagarinho assaltar-me a timidez,
Assolar-me a tranquilidade,
Cravejar-me de saudades
A maresia circundante da minha pele.
Ouço vozes de escárnio aguçado,
Permito-me ouvir sem saber
Aquilo que me dizem os monstros
Que habitam as casas
Construídas pelas minhas mãos feridas.
Escrevo no bloco de notas
As palavras em mim para o momento
E nada cresce mais devagar
Que a felicidade efémera.
De repente a fina bola de sabão
A quebrar-se em mil partículas...
Bola de um coração profanado
Pelos demónios sem perdão,
Levando do meu ser a última esperança...
O último raio de sol do teu sorriso...
*a.d*

Bolha de Sabão


Bolha de sabão é que nem silêncio: a gente pode dizer que não existe.
É uma das coisas mais bonitas do mundo: colorida de todas as cores do arco-íris,
toda redonda, voando livre, leve e alto. João disse (sem falar) pro menino: a vida da gente pode ser uma bolha de sabão (...). Se a gente aprende a ser colorido, a voar livre, leve e alto até explodir bonito,sem muito barulho, deixando no ar uma gotinha de saudade."
Do livro João Teimoso
Luiz Raul Machado

Pó de Estrela


Somos feitos
da mesma matéria
que as estrelas
e os amores-perfeitos


Somos feitos
de pó de estrelas


Jorge Sousa Braga .

Poema da Árvore


As árvores crescem sós. E a sós florescem.

Começam por ser nada. Pouco a pouco
se levantam do chão, se alteiam palmo a palmo.

Crescendo deitam ramos, e os ramos outros ramos,
e deles nascem folhas, e as folhas multiplicam-se.

Depois, por entre as folhas, vão-se esboçando as flores,
e então crescem as flores, e as flores produzem frutos,
e os frutos dão sementes,
e as sementes preparam novas árvores.

E tudo sempre a sós, a sós consigo mesmas.
Sem verem, sem ouvirem, sem falarem.
Sós.
De dia e de noite.
Sempre sós.

Os animais são outra coisa.
Contactam-se, penetram-se, trespassam-se,
fazem amor e ódio, e vão à vida
como se nada fosse.

As árvores não.
Solitárias, as árvores,
exauram terra e sol silenciosamente.
Não pensam, não suspiram, não se queixam.

Estendem os braços como se implorassem;
com o vento soltam ais como se suspirassem;
e gemem, mas a queixa não é sua.

Sós, sempre sós.
Nas planícies, nos montes, nas florestas,
a crescer e a florir sem consciência.

Virtude vegetal viver a sós
e entretanto dar flores.

António Gedeão

Guardador de Rebanho


A Criança Eterna acompanha-me sempre.



A direção do meu olhar é o seu dedo apontando.



O meu ouvido atento alegremente a todos os sons



São as cócegas que ela me faz, brincando, nas orelhas.




Damo-nos tão bem um com o outro



Na companhia de tudo



Que nunca pensamos um no outro,



Mas vivemos juntos e dois



Com um acordo íntimo



Como a mão direita e a esquerda.




Ao anoitecer brincamos as cinco pedrinhas



No degrau da porta de casa,



Graves como convém a um deus e a um poeta,



E como se cada pedra



Fosse todo um universo



E fosse por isso um grande perigo para ela



Deixá-la cair no chão.(...)






(Alberto Caeiro)

Alma Lavada


Lavo a alma
Lavo a alma bem lavada
Lavo a alma
Lavo com omo total

Lavo a alma
Lavo a alma bem lavada
Lavo a alma
Escovo e passo fio dental

Enxáguo, esfrego
Enxáguo, esfrego
Enxugo e passo talco de neném

Quero a alma
Quero a alma renovada
Lavo a alma
Lavo e esfrego com varsol

Quero a alma
Quero a alma renovada
Lavo a alma
Lavo e seco no varal

Enxáguo, esfrego
Enxáguo, esfrego
Enxugo e passo a ferro muito bem

Alma lavada, alma lavada
Dessa vida não se leva nada
Dessa vida não se leva nada

Lavo a alma
Lavo a alma bem lavada
Lavo a alma
Lavo com sabão em pó

Lavo a alma
Lavo a alma bem lavada
Lavo a alma
Lavo e esfrego sem ter dó

Enxáguo, esfrego
Enxáguo, esfrego
Enxugo e passo talco de neném

Quero a alma
Quero a alma bem lavada
Lavo a alma
Lavo e passo pinho sol

Quero a alma
Quero a alma renovada
Lavo a alma
Lavo e seco no quintal

Enxáguo, esfrego
Enxáguo, esfrego
Enxugo e passo a ferro muito bem

Alma lavada, alma lavada
Dessa vida não se leva nada
Dessa vida não se leva nada

Titãs
A vida podia ser apenas estar sentado na erva,
segurar um malmequer e não lhe arrancar as pétalas,
por serem já sabidas as respostas,
ou por serem estas de tão pouca importância,
que descobri-las não valeria a vida de uma flor.
(José Saramago)

Esperamos


Esperamos demais para dizer


as palavras de perdão que


devem ser ditas, para pôr de


lado os rancores que devem


ser expulsos, para expressa


gratidão, para dar ânimo,


para oferecer consolo


Henry Sobel

Próposito


É de licor


De suspiro e apresso


Repleto de arejamento




É de valor


De alento e adereço


Segredo de firmamento




É de beija-flor


De explendor e refresco


Perfume de intento




É de vapor


De cura e endereço


Riso de aliciamento




É de tremor


De jura e arremesso


Susto de sentimento




Selei por instinto


O mapa que desdobrei


Extraviei por labirinto


Destino lhe entreguei




*Cris Poesia*

Margarida

...

..


.

Serenidade


Feriram-te, alma simples e iludida.
Sobre os teus lábios dóceis a desgraça,
Aos poucos esvaziou a sua taça
E sofreste sem trégua e sem guarda.
Entretanto, à surpresa de quem passa,
Ainda e sempre, conservas para a Vida,
A flor de um idealismo, a ingênua graça
De uma grande inocência distraída.
A concha azul envolta na cilada
Das algas más, ferida entre os rochedos,
Rolou nas convulsões do mar profundo;
Mas ainda assim, poluída e atormentada,
Ocultando puríssimos segredos,
Guarda o sonho das pérolas no fundo.
*Raul de Leoni*

Luz


A luz que de ti me vem
Devolvo-a
Amorosamente
A tudo quanto existe
*Alberto de Lacerda*

"As Fadas e eu Namolados


A Fada AZUL
Tem um namorado caliente
Que lhe cobre de carinho
Sempre lhe enche de beijinhos
E ela fica toda arrepiadinha..

Fada Ruiva
Quando o desejo a chama
Ela perde o controle rsrs
Deixa o amado louquinho
Só querendo carinhos rsrs

Fada Amarela
Voa livre e assanhada
Quando pousa essa danada
Beija o sapo e avoada
Deixa o príncipe na calçada!!!
rsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrrssrsr
(Graciela da Cunha, Paty Padilha e Bernadette Moscareli)

Menina Selvagem


A menina selvagem veio da aurora
acompanhada de pássaros,
estrelas-marinhas
e seixos.
Traz uma tinta de magnólia escorrida
nas faces.
Seus cabelos, molhados de orvalho e
tocados de musgo,
cascateiam brincando
com o vento.
A menina selvagem carrega punhados
de renda,
sacode soltas espumas.
Alimenta peixes ariscos e renitentes papagaios.
E há de relance, no seu riso,
gume de aço e polpa de amora.

Reis Magos, é tempo!
Ofereci bosques, várzeas e campos
à menina selvagem:
ela veio atrás das libélulas.

*Henriqueta Lisboa*

Voa Comigo


Vamos encantar horizontes
Dar rodopios e razantes aos montes
Brincar de esconder com as nuvens errantes
Colar pelo céu estrelinhas brilhantes

Desvendar segredos...

Espantar os males antes que nos espantem
Iluminar a estrada dos viajantes
Encontrar o pote de ouro
no final do arco-íris

Levar conforto aos corações doentes
Surfar a onda mais perfeita do mundo
Namorar Netuno lá no fundo do mar
Te dou asas, vamos voar!

*Paty Padilha e Bernadette Moscareli*

Mágoa


Caso seu coração tenha sido magoado
Pede pra Deus te orientar
Ele concerteza será dedicado
E saberá te tirar da dor

Se o motivo da mágoa foi uma desavença
Com uma amiga querida
Pede pra Deus iluminar
Os caminhos que por onde ela passar

Que essa amizade tão linda
Que agora está ferida
Seja abençoada com paz e amor.



Paty Padilha

"Para sonhar um ano novo que mereça este nome,você, meu caro,tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo,eu sei que não é fácil, mas tente,
experimente, consciente. É dentro de você que o
Ano Novo cochila e espera desde sempre."
(Carlos Drummond de Andrade)

Encontrei-te


Encontrei-te no Infinito, eu sabia que tu existias.
Os astros me diziam,eu sentia!
O vento segredou-me os murmúrios da tua alma.
Ah...como eles eram tão iguais aos meus! Ouvia-te na sinfonia das ondas e a minha alma dançava a valsa do amor encantado. Os meus olhos cantavam as mais belas baladas que só tu ouvias.
Sentia os teus braços envolverem-me com a maciez do teus carinhos de seda.
Sentia a brisa do teu mar tocar a minha face de veludo.
Ah como eu te procurei....
Neste infinito que nos sussurrava os nossos mistérios!
Agora entendi os enigmas do tempo!
Caminhei, soberana dos meus desejos, dos meus anseios,e vislumbrei o teu majestoso castelo!
Vi que me esperavas sentado no lugar onde ousavas sonhar comigo.
Onde esperavas ver cumprida a profecia do nosso destino.
Encontrei-te, Reconheci-te, Amar-te-ei até à eternidade!

Mimo


Se o teu corpo, o teu nome
Com o meu não combina,
Façamos então, das nossas almas, a rima.
“As almas se entendem, os corpos não.”
E nos elevemos além da matéria.
Rima rica, rima pobre...
Correta - ou torta...
Desmedida... metrificada... não importa!
Eu te levaria, independente dela,
Ao ponto mais alto da colina.
Mas já que não posso, façamos um trato:
E como ele não pode ser concreto,
Que seja então abstrato.
No meu sonho,
Eu te imagino, te pinto,
Te nino, faço um mimo,
Te ensino... e aprendo.
Se você me ensina.
É que...
“No quintal de lá de casa
Tem um pé de sonho....”
Marcos Aurélio Mendes

Orvalho e Luar

Sou feita de orvalho e luar
Tenho o cheiro da terra
A natureza é meu lar
Meu refúgio é as estrelas
O vento é meu cantar
Numa esperança espontânea
Eu corro solta pra amar
O sonho deita em flores
Fruta fresca é meu sabor
A esperança é meu guia
Entre aromas e cor
Vou sem medo e cara limpa
Puro instinto pecador
O medo maior que sinto
É não pecar por amor
Colho os versos esquecidos
Deito fora toda a dor
Eu sou pura melodia
Dos olhos de quem chorou
Pés descalços na saudade
Piso firme nesse chão
Despedaço minhas flores
Guardo as pétalas no coração
Vivo o agora feliz
E faço a noite calar
Somente o vento se agita
Pras minhas asas voar
Ane Franco

Amamos


"Amamos outra pessoa não por quem ela é,
mas por quem nos tornamos na sua presença."

Amigos unem-se Pelo Coração


Amigos unem-se Pelo Coração
Sem palavras,
Sem compromissos,
Sem cobranças,
Sem trapaças...
Sem interesses,
Sem susceptibilidades,
Sem expectativas,
Sem culpas,
Sem vaidades...
Quem pensa que engana,
Engana-se...
Não é possível enganar um coração!
Somente os sentimentos podem unir pessoas
Quaisquer que sejam.
Sejam bons ou maus,a reciprocidade faz o elo.
Que o nosso elo seja verdadeiro,um sentimento de coração a coração!.

Mãos Sinceras


Mãos que procuram amizade,sempre encontram reciprocidade...
Amizade é o mais puro sentimento,se doa até por pensamento...
Um quente aperto de mão,sempre será um afago no coração...
Feliz daquele que a sabe transmitir,sendo amigo sem precisar fingir...
Espalhar amizade,eis a mais completa felicidade que se pode almejar...
Venha minha mão apertar,deixe-me te abraçar...
Com o carinho da amizade,de nada mais temos necessidade...
Ofereça-me tua mão,e terás meu coração!!

Sentido


"O Sentido e a essência não se encontram em algum
lugar atrás das coisas,senão em seu interior, no íntimo de todas elas."
(Hermann Hesse)

Maktub

Já estava escrito
No tempo e no espaço
Que a minha alma e tua
Uma luz seriam

Já estava escrito
Pelos milênios
Que no sagrado fogo da paixão
Nos consumiríamos

Sol do deserto
Queimando a areia
Tua presença é água
Que preserva a vida

Pomba selvagem
No azul da alma
Teu amor é luz
Que ilumina e cega

Já estava escrito
E Allah o sabe
Que a serpente mágica do amor
Nos faria deuses

Está escrito
Antes dos tempos
Que a vida vale apenas
Quando o amor nos toca...
Marcus Viana

Súplica


Agora que o silêncio é um mar sem ondas,

E que nele posso navegar sem rumo,

Não respondas

Às urgentes perguntas

Que te fiz.

Deixa-me ser feliz

Assim,

Já tão longe de ti como de mim.

Perde-se a vida a desejá-la tanto.

Só soubemos sofrer, enquanto

O nosso amor

Durou.

Mas o tempo passou,

Há calmaria...

Não perturbes a paz que me foi dada.

Ouvir de novo a tua voz seria

Matar a sede com água salgada.



Miguel Torga

Estações


E roda o tempo suas quatro estações.

Se cai folhas no outono,a primavera

Borda em cor o campo,tudo recupera

Trazendo aos olhos flores e emoções.

Se o inverno é rigoroso aos corações,

A ansiedade ronda, bate espera

As luzes que anunciam a quimera

Quando num brilhante col,faz-se os verões.

E como nas estações se faz a vida.

Mas,será vale só guardar comida

Como a Formiga faz,sempre estocando?

Ou viver assim feito uma cigarra

Que canta e canta e no cantar se agarra

Ao ponto de ao morrer ,morrer cantando?



Jenário de Fátima

UM APÓLOGO


Era uma vez uma agulha, que disse a um novelo de linha:

-Por que está você com esse ar, toda cheia de si, toda enrolada, para fingir que vale alguma cousa neste mundo ?

-Deixe-me, senhora.

Que a deixe? Que a deixe, por quê? Porque lhe digo que está com um ar insuportável?

Repito que sim, e falarei sempre que me der na cabaça.

Que cabeça, senhora? A senhora não é alfinete, é agulha. Agulha não tem cabeça.

Que lhe importa o meu ar? Cada qual tem o ar que Deus lhe deu. Importe-se com a sua vida e deixe a dos outros.

Mas você é orgulhosa.

Decerto que sou.

Mas por quê?

É boa ! Porque coso. Então os vestidos e enfeites de nossa ama, quem é que os cose, senão eu?

Você? Esta agora é melhor. Você que os cose? Você ignora que quem os cose sou eu, e muito eu?

Você fura o pano, nada mais; eu é que coso, prendo um pedaço ao outro, dou feição aos babados...

Sim, mas que vale isso? Eu é que furo o pano, vou adiante, puxando por você, que vem atrás, obedecendo ao que eu faço e mando...

Também os batedores vão adiante do imperador.

Você imperador?

Não digo isso. Mas a verdade é que você faz um papel subalterno, indo adiante; vai só mostrando o caminho, vai fazendo o trabalho obscuro e ínfimo.

Eu é que prendo, ligo, ajunto...

Estavam nisto, quando a costureira chegou à casa da baronesa. Não sei se disse que isto se passava em casa de uma baronesa, que tinha a modista ao pé de si, para não andar atrás dela.

Chegou a costureira, pegou do pano, pegou da agulha, pegou da linha, enfiou a linha na agulha, e entrou a coser. Uma e outra iam andando orgulhosas, pelo pano adiante, que era a melhor das sedas, entre os dedos da costureira, ágeis como os galgos de Diana – para dar a isto uma cor poética. E dizia a agulha:

-Então, senhora linha, ainda teima no que dizia há pouco? Não repara que esta distinta costureira só se importa comigo; eu é que vou aqui entre os dedos dela, unidinha a eles, furando abaixo e acima...

A linha não respondia nada; ia andando. Buraco aberto pela agulha era logo enchido por ela, silenciosa e ativa, como quem sabe o que faz, e não está para ouvir palavras loucas.

A agulha, vendo que ela não lhe dava resposta, calou-se também e foi andando. E era tudo silêncio na saleta de costura; não se ouvia mais que o plic-plic-plic-plic da agulha no pano. Caindo o sol, a costureira dobrou a costura para o dia seguinte;continuou ainda nesse e no outro, até que no quarto acabou a obra, e ficou esperando o baile.

Veio a noite do baile, e a baronesa vestiu-se. A costureira, que a ajudou a vestir-se levava a agulha espetando corpinho, para dar algum ponto necessário. E enquanto compunha o vestido da bela dama, e puxava a um lado ou outro, arregaçava daqui ou dali, alisando, abotoando, acolchetando, alinha, para mofar da agulha, perguntou-lhe:

Ora agora, diga-me, quem é que vai ao baile, no corpo da baronesa, fazendo parte do vestido e da elegância? Quem é que vai dançar com ministros e diplomatas, enquanto você volta para a caixinha da costureira, antes de ir para o balaio das mucamas? Vamos, diga lá.

Parece que a agulha não disse nada; mas um alfinete, de cabeça grande e não menor experiência,murmurou à pobre agulha: - Anda, aprende, tola. Cansas-te em abrir caminho para ela e ela é que vai gozar da vida, enquanto aí ficas na caixinha de costura. Faze como eu, que não abro caminho para ninguém.

Onde me espetam, fico.

Contei esta história a um professor de melancolia, que me disse, abanado a cabeça: - Também eu tenho servido de agulha a muita linha ordinária!
*Machado de Assis*

Eu fui para uma floresta de nogueiras,
Porque minha mente estava inquieta,
Eu colhi e limpei algumas nozes,
E apanhei uma cereja, curvando o seu fino ramo;
E, quando as claras mariposas estavam voando,
Parecendo pequenas estrelas, flutuando erráticas,
Eu lancei framboesas, como gotas, em um riacho
E capturei uma pequena truta prateada.
Quando eu a coloquei no chão
E fui soprar para reativar as chamas,
Alguma coisa moveu-se e eu pude ouvir,
E, alguém me chamou pelo meu nome:
Apareceu-me uma jovem, brilhando suavemente
Com flores de maçãs nos cabelos
Ela me chamou pelo meu nome e correu
E desapareceu no ar, como um brilho mais forte.
Talvez eu esteja cansado de vagar em meus caminhos
Por tantas terras cheias de cavernas e colinas, recusar aceitar
ઇ‍ઉ ßë®ñåð놆ë: Eu vou encontrar o lugar para onde ela se foi,
E beijar seus lábios e segurar suas mãos;
Caminharemos entre coloridas folhagens,
E ficaremos juntos até o tempo do fim do tempo, colhendo
As prateadas maçãs da lua,
As douradas maçãs do sol.


*William Butler Yeats*





quando sinto a poesia


dentro do corpo


é que seique não estou morto -


Sob as pálpebras,


no rosto,


entre os dedos,


as palavras,


omo crisálidas adormecidas,


esperam,


trêmulas,


as asas que as desprendam -


as asas que tu lhes trazes! -


Pois é só quando chegas


e me beijas o corpo,


verso a verso,


e o lês como se lê um livro,


que elas se libertam


e eu sei que estou vivo -


E vou


e vôo


em cada palavra


ao encontro de ti


ao encontro de mim


no corpo do poema.




*António Simões, "Versos Antigos".*

Os Amigos

Os Amigos amei
despido de ternura
fatigada;
uns iam,
outros vinham,
a nenhum perguntava
porque partia,
porque ficava;
era pouco o que tinha,
pouco o que dava,
mas também só pedia a liberdade;
por mais amarga.
Eugénio de Andrade, in "Poetas escolhem Poetas

Indefesa


O caminho para todas as coisas
grandiosas
passa pelo silêncio



NIETZSCHE

Canto a Mim Mesmo


Com música forte eu venho,
com minhas cornetas e meus tambores:
não toco hinos
só para os vencedores consagrados,
toco hinos tambémpara as pessoas batidas e assassinadas.
Vocês já ouviram dizerque ganhar o dia é bom?
Pois eu digo que é bom também perder:
batalhas são perdidas
com o mesmo espírito
com que são ganhas.
Eu rufo e bato o tambor pelos mortos
e sopro nas minhas embocaduras
o que de mais alto e mais jubiloso
posso por eles.
Vivas àqueles que levaram a pior!
E àqueles cujos navios de guerra
afundaram no mar!
E a todos os generais
das estratégias perdidas,
que foram todos heróis!
E ao sem número de heróis maiores
que se conhecem!
*Walt Whitman*

Ensinamento


Minha mãe achava estudo
a coisa mais fina do mundo.
Não é.
A coisa mais fina do mundo é o sentimento.
Aquele dia de noite, o pai fazendo serão,ela falou comigo:
"Coitado, até essa hora no serviço pesado".
Arrumou pão e café, deixou tacho no fogo com água quente,
Não me falou em amor.
Essa palavra de luxo.

*Adélia Prado*

Treze Maneiras de ( Não ) Colher Uma Rosa




I
Colocam-se as mãos à volta da rosa,sem lhe tocar,para lhe roubar a forma,das pétalas ao pé.
II
Toca-se na rosa com a boca,até nossos lábios serem pétalas.
III
Aspira-se-lhe o perfume intensamente,até substituir o sangueem nossas veias por inteiro.
IV
Fecham-se os olhos,e, como num sonho,levamos a rosa para dentrodo nosso coração.
V
Embrulha-se a rosa no nosso olhar,atada com os fios do vento.
VI
Atrai-se a rosa a um encontro,num lugar secreto da nossa alma,e não se deixa mais sair de lá.
VII
Olha-se a rosa fixamente,e com o fio de aço do nosso olhar,corta-se-lhe o pé.
VIII
Tira-se todo o jardim à volta da rosa,para que ela venha até nós,ferida de solidão.
IX
Captura-se-lhe a chamaquando a sua cor se confundecom o poente ou o raiar da manhã.
X
Deixa-se que o crepitar da rosaentre em nossa alma,misturado com o sussurrar de uma seara.
XI
Faz-se-lhe uma embuscadaquando o vento da tardetransporta o seu perfumedum lado para o outro.
XII
Esperamos pacientementeque se dilua no orvalho que a cobre toda,e bebemo-la depois,gota a gota.
XIII
Deixamos a rosa, livre, intacta,para a podermos colher,com a avidez dos nossos sentidos.

António Simões

Há Dias


Há dias em que julgamos que todo o lixo do mundo nos cai em cima depois ao chegarmos à varanda avistamos as crianças correndo no molhe enquanto cantam não lhes sei o nome uma ou outra parece-me comigo quero eu dizer : com o que fui quando cheguei a ser luminosa presença da graça ou da alegria um sorriso abre-se então num verão antigo e dura dura ainda.

*Eugénio de Andrade de Os lugares de Lume*

De conversa pra lá, de conversa pra cá


De conversa pra lá, de conversa pra cá


gira, gira, o mundo


dou flores pra quem quer ficar


ganho anéis de quem quer me dar


nada me derruba, nem me deixa triste


gosto de sorrir, não gosto de chorar


sacudo a saia e volto a dançar


acendo a fogueira e vou rodopiar


converso com a Lua


brindo o céu com vinho tinto


pego meus tecidos e vou colorir poesias


cheiro a flor do manjericão


e tomo a espada da luta das ancestrais



meu coração é protegido e é feito para pulsar


as palavras dos meus olhos são refletidas no espelho


e quem quiser comigo poetar


os versos são mesclas das conversas das Estrelas


que cochicham aos ouvidos dos mortais

Quando uma Cigana Ama

Quando uma cigana ama....
Se entrega ao seu amado sem medo de ser feliz
Realiza seus desejos mais secretos..ama por prazer, por desejo, por paixão
Carrega em sua saia a magia do encantamento
Na sua tenda sob a luz do luar sabe envolver seu amado
Carrega no olhar o raio das lua, o mistério que esse amor envolve
O gosto de seu beijo imobiliza seu amado
E nessa troca de prazer e magia corpos se entregam..
Almas se encontram
Vidas caminham numa mesma estrada...
Assim ama uma cigana..e assim é amado seu companheiro....

Optchá!!!

Cigana


Cigana
Minha alma te desperta desejos
Nunca imaginados, fagueiros.
Como o sol que avança,
Atravesso as estações,
Sem pedir licença.
Mantenho como uma pintura,
A primavera com seus encantos.
Espetáculo das dormideiras
E dos salgueiros soltos ao vento.
Sobreviventes aos vis lanhos.
Revoadas... passarinhos em orquestra
E a presença dos estranhos mochos.
Flores salpicando a paisagem,
Dos ipês amarelos e roxos.
O tapete verde jogado á beira do lago,
a espera dos cervos... lindas galhadas.
O sabor das frutas silvestres,
Ainda não experimentadas.
Teus olhos de pessoa comum
E o teu coração sem nobreza,
Não conseguem alcançar tanta beleza,
A minha essência, sou uma cigana,
Meu nome é natureza!

Cigana da Sedução


Trago comigo a magia da sedução...
O encanto da noite enluarada...
Em meu olhar te oferto...
O brilho das estrelas...
Carregado de paixão...

Na voz tenho veludo...
No olhar o feitiço...
Vai chega mais perto...
Olhe em meus olhos...
Toque em meu corpo...
E sinta o meu coração...

Continue olhando em meus olhos...
Vejo aqui o encontro...
Do destino marcado...
Sem juramento...
Que o tempo ainda não esqueceu...

Acredite sou cigana...
Não pense que estou a te enganar...
Beba esta taça de vinho...
Que a mulher de seu destino...
Sou eu cigana da sedução...
Nesta noite de luar...